quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Apocalipse

gabriel m. ribeiro

Preciso de amarras seguras
correias de aço
cabos de couro
argamassa coronariana
marca-passos dos intestinos sentimentais.
Preciso da espuma do chope,
expulso da garganta a coceira alérgica,
purgo e exporto soluços e espirros
recebo e importo afagos e beijos.
Na estante troco de lugar
o arroz, o Buda e o elefante branco,
mas preservo o recanto de Augusto dos Anjos,
e empresto à sobrinha um J.G de Araújo Jorge,
re-folheio as cartas de Rilke e impressos de cordel.
Em outra prateleira sarcástica,
sempre de prontidão,
perfilados alfabeticamente
vinis do seco blues de Alberta Hunter,
até o polêmico ritmado Van Morrison.
As poeiras caem neste acervo
e sobem comigo os degraus da vida,
enrugando-se como a tela da testa
ressecando-se como pele de cotovelo.
Coloco esparadrapo cor da pele
e substituo meus sonhos cicatrizes
por novas borbulhas achampanhadas,
enquanto queimam varetas de sândalo
junto a um cristal de ametista.
Revista de músicas cifradas
e dicionário de palavras cruzadas,
um porta-retrato de cartolina
presente de escola no dias dos pais.

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