sábado, 26 de novembro de 2011

Como Castigo: Comer Jiló!

gabriel m. ribeiro
A memória repassa por estreitos corredores e escadas de uma casa de dois andares da Rua Cândido Gaffrée, onde outrora funcionou o Externato Cristo Redentor.
Uma escola que só atendia ao antigo curso primário - Jardim de Infância até à 4ª série.
Em sua direção as Irmãs Braga Furtado, D. Yvone e D. Yolanda, ambas já falecidas.
D. Yvone era uma liderança comunitária, e seus alunos recebiam rigorosa formação acadêmica e cívica. Muito religiosa, impunha às turmas, em formação no pequeno pátio frontal, além do hino nacional, as orações diárias.
Indisciplina não cabia dentro daquele colégio, pois D. Yvone reprimia com austeridade desde o início e esta não encontrava espaço para vingar.
Como curiosidade, entretanto, havia a punição que ela aplicava para quem ‘aprontasse’ mais do que o normal: a família era comunicada que o aluno ficaria na escola e almoçaria na casa dela. O “menu-castigo” seria: ensopado de jiló!
Qual nada, os poucos que sofreram esta penalidade almoçavam na verdade um belo bife, com batatas fritas e sorvete de sobremesa, mas com uma condição imperativa: teriam que confirmar a história do jiló para os demais (em uma cumplicidade secreta com ela). Demorei muito a saber disto.
Assim, D. Yvone e D. Yolanda lideraram esta maravilhosa instituição educacional com brilhantismo, até que a funesta Lei 5692/71, desorganizou a vida de inúmeras escolas que, como essa, só comportavam fisicamente o antigo curso primário.
Foi um duro golpe, a escola sofreu, as irmãs também e a comunidade perdeu um ícone da educação dos anos 50/60.
Mas com a missão cumprida, creio que as irmãs devem estar dando jiló para os anjos e serafins...

RJ, 25 / 07 / 08

Festa Junina

Em 1996, no Centro Educacional Anísio Teixeira (CEAT) – Santa Tereza – RJ, onde meus filhos estudaram, houve mais uma festa junina. O CEAT fica instalado em um castelo (de pedra, com torre e tudo, como nas histórias). O mote da festa era Luiz Gonzaga e Ana Cristina, maravilhosa professora de música foi a “âncora” da festa, conduzindo com maestria as várias etapas da mesma.
O dia estava horrível, um temporal ameaçava a festa, mas aí...

FESTA JUNINA
gabriel m. ribeiro

Era uma tarde fria de Sábado,
o tempo estava feio,
a torre de pedra agredia o cinza do céu,
a nuvem cor de chumbo envolvia a torre.
Tudo dizia para ficar em casa
ouvindo música, tomando vinho,
comendo queijinho...

Mas a tropa estava lá,
a mulherada do CEAT!
Mulherada de trança
laço de fita,
pinta no rosto e baton forte,
todas com sotaque de alegria.

A nuvem ficou mais baixa
mais agressiva,
mas a roda não parou
O fole foi e veio, veio e foi
Luiz Gonzaga
São Luiz Gonzaga
O do Gonzaguinha, o Gonzagão
Rei do Nordeste, da caatinga
do baião, do Sertão,
Rogai por nós.

A nuvem pretaiô,
mas Asa Branca bateu asas no CEAT
e a nuvem espalhou.

Xote, calango, catira
Jongo, toada, baião
Quadrilha...
...qual fogueira de São João!

E a mulherada na pilha
sem deixar a emoção fraquejar
cantando, girando, voando,
no som da viola, zabumba,
do arrasta sandalha,
da tremenda vontade de bailar.

Num choveu não sinhô
mas os rostos se molharam de suor
os olhos choraram de emoção
e a alegria de fazer bem feito
tomou conta da quadra,
subiu pela torre,
invadiu o castelo
e ficou no coração!

Parabéns pessoal que trabalhou
Impossível esquecer esta tarde
em que a nuvem negra,
cor de chumbo
nas asas de Gonzaga,
no colo do CEAT
na força de Ana Cristina
Cor de prata ficou!!!

- 11/06/96 -

A Festa de Lucy

gabriel m. ribeiro

Ladeira dos Asturras, nobre Santa Teresa
Paralelepípedos em constelação urbana
Salão em arte decô, fios e som sobre a mesa
Dois sofás nus, sem cristais, nem porcelana.
Os quadros impressionistas rompem a frieza
O som, sutil flash-back, embala e engana
Os vestidos negros modelam as tigresas
Jeans e blaisers rompem a formalidade tirana.
A porta sempre aberta reafirma a clareza
Da presença infalível, altiva e soberana
De companheiros, colegas, amigos com certeza
Numa festa pagã, em uma noite mundana.

O som rasgava a cúmplice penumbra
Ocultava dramas e misturava os perfumes
Escondia as idades, e a vaidade deslumbra
Permitindo um flerte ousado, olhares e ciúmes.
Angústias das almas sangrentas e solitárias
Oferecia o bailar ondulado de ancas empinadas
Sugeria a permissiva atitude voyeur arbitrária
No decote ousado, ou nas pernas cruzadas.
Estimulava o fútil consumo dos vinhos
O beber intenso, ritmado, febril da cerveja
O cigarro mentol, a colônia de silvestre pinho
A diamba e o batom nos lábios cor de cereja.

A festa começava dentro de cada um
As livres conversas partiam-se pelo meio
As músicas viajam em tempos incomuns
Os corpos suavam suas carências sem freio.
As pernas bailavam intencionalmente sensuais
Os beijos enguliam-se em sôfregas paixões
Os canapés coloriam a mesa dos comensais
O gelo, amálgama de uísque e intenções.
A solidão da noite crescia para alguns
A evidente noite de amor a outros excitava
Na porta do toillete simpatias, zum-zuns
A festa, dentro de todos, continuava...

-16/05/99-