terça-feira, 24 de maio de 2011

2008 - A Madrugada Estava Linda...

gabriel m. ribeiro 

 

A insônia, quando não crônica, patológica, muitas vezes pode ser um pequeno sinal do inconsciente querendo bater um papinho mais reservado com um Eu consciente.
Mas esta seara é por demais complexa e nela me reservo ao direito de apenas tentar entender alguns poucos rudimentos, sem procurar me transformar em analista/analisado de marie claire, contigo, etc...
Entretanto, nessas conversas surdas e inquietas, muitas verdades pululam nuas, indecentemente nuas, não nos permitindo empurrá-las para debaixo do tapete, ou do travesseiro, e o jeito é conversar com elas e perceber o que pode ser feito para que ela se aquiete pela solução tomada.
Assim, meus macaquinhos saltitaram dentro das inescrupulosas lembranças até que passei para a frequência do devaneio.
A lua estava cheia demais, mais parecendo aquele queijão de minas de tão clara, transformando o ondulado da baía de Guanabara em espelhos salpicados, adornando as copas das árvores com reflexos ligeiramente prateados. Ouvi no dicão 78rpm, de memória biológica, a primeira estrofe de Zé do Norte:
"Lua bonita,
Se tu não fosses casada
Eu preparava uma escada
Pra ir no céu te buscar..."
E foi relembrando este xote, da harmonia do acordeão, do tilintar do triângulo e marcação da zabumba, que a parte alagoana do meu sangue lisergicamente se infiltrou nos labirínticos percursos da fantasia, e entre aquelas verdades nuas, e novas inverdades vestidas para a festa do fantástico, permeou os momentos solitários desta madrugada.
Vi uma bruxa bonita navegando em vassoura de náilon, movida a energia lunar, vestida em longo de seda fina, botas da Arezo, e com prótese de silicone no busto... e ela carregava uma faixa de protesto!
Também percebi que, pulando pelos muros, em rápidos movimentos, com um bela capa bordada com carnavalescas pedras e lantejoulas, o justiceiro Zorro deixava escrito, com a ponta do florete, frases de protesto.
Cavalgando em velocidade, saindo das escuras ruas, atendendo aos tambores de Guran, o Fantasma da Selva e seu fiel escudeiro, o lobo Capeta, percorriam as caixas de correio e deixavam mensagens, quando então, as marcava com seu anel algumas letras de protesto.
Assim, vários heróis da minha infância que comigo a compartilharam por essas ruas, becos, escadarias, matas, morros, pedras e praias, desfilaram nesta insone madrugada.
Mas o temor maior foi quando percebi que a criptonita não era verde como sempre contaram. É branca e que podia ser manipulada para o mal. E pior ainda, uma parte gigantesca dela havia caído na praia da Urca e estava ameaçando todo o bairro. Muitas pessoas não conhecendo seu poder de contaminação e destruição a contemplavam, como que hipnotizadas.
Meu Deus, o que fazer? Será que nossa civilização comunitária seria extinta como já o foram tantas outras. O poder dos Césares um dia ruiu. Maias, Incas, Astecas sucumbiram diante da ganância hispânica. Faraós demonstram hoje suas magnitudes em monumentos arqueológicos. Nem o imponente Império Britânico resistiu... e para nós, deste pequeno recanto do planeta, o que nos está sendo reservado???
Ao amanhecer pudemos ver o que nossos heróis escreveram, ou deixaram marcados como forma de protesto: URCA SIM, IED NÃO!
Cabe lembrar, que apesar de tudo, a madrugada estava linda...

RJ. 15 / 10 /08
gabriel m. ribeiro
educador



Nenhum comentário:

Postar um comentário